“Permanecer
ou sair da caverna?
Eis
uma questão transversal à humanidade…
É
melhor desfrutar de uma realidade fantasiosa, mas confortável…
Ou
vivenciar a verdade com toda a sua dureza?
É
verdade… Viver como sujeito consciente tem elevados custos a todos os níveis…
Talvez
por isso, já no próprio mito da caverna platoniano…
Os
homens preferiam contentar-se com as sombras…
Ao
invés de enfrentarem o lado de fora… A realidade!
Afinal,
por mais falsa que as sombras sejam…
Elas
estão sob a proteção constante das paredes rochosas da caverna…
O
que significa que ao decidir sair, não há retorno…
Pois
as rochas, que o olhar do escravo entende como de proteção…
Para
os que despertam, representam uma prisão…
O
desconhecido magnetiza o Homem através medo….
Por isso,
muitos de nós, na maior parte das vezes, preferimos permanecer onde estamos…
Escolhemos
continuar no velho, face ao benefício do conhecido e da permanência…
Do que enfrentar o temido novo, o qual ainda
não conhecemos…
E
não sabemos o que nos poderá trazer…
Ou
seja…
Ainda
que a situação que vivenciamos seja adversa…
Tendemos
ao comodismo pelo medo do que ainda não conhecemos…
E,
portanto, pode ser pior do que o já vivenciado…
Mas,
a gravidade da questão…
É que este comodismo ou complacência...
Não se restringe apenas ao medo do
desconhecido…
Mas também à própria falta de vontade em esforçar-nos...
Para que a condição seja
modificada…
O
que é que esta atitude perniciosa nos levou?
Vivemos
hoje numa era de servidão voluntária!
E como referiu Baudrillard:
«A servidão voluntária transformou-se no admirável
mundo novo»…
Lugar
em que a técnica e a ciência consegue suprir todas as necessidades humanas…
Sim,
é um facto…
As revoluções técnicas e científicas que aconteceram...
Trouxeram-nos importantes conquistas…
Descobertas
e aperfeiçoamentos que tornaram a nossa vida melhor em muitos aspetos…
Contudo,
a história mostra-nos que entre a real capacidade dessas revoluções…
E o
que dela se extrai há um grande abismo…
A nossa realidade de hoje aproxima-se, assim...
Muito mais das grandes distopias do
século XX…
Do
que à de um éden de terceira dimensão…
E, como
se isso não bastasse…
Ainda
que esta realidade esteja mais do que clara…
Em
vez de a questionarmos, ela fortalece-se cada vez mais…
O Homem
parece que prefere ser administrado…
E
saber que as suas necessidades básicas são satisfeitas…
Tornou-se,
afinal, num animal consumista…
Importa
é sentir-se confortável e ser bem atendido…
Desde que o consumo (suporte da satisfação e do controle)...
Esteja sempre ao alcance
das mãos…
Aliás,
nem convém que ele saia do lugar para entrar na roda da felicidade do consumo…
E
como estamos perante uma sociedade de controle…
Não é preciso dizer...
Que existe uma dura repressão para todos os que fogem à ordem imposta…
Os quais
são vistos como ‘inadequados’ como dizia Huxley…
E
aqui atente-se…
Como
todo o bom sistema que evolui…
A
repressão não ocorre de modo explícito ou através de chicote…
Mas
antes, de maneira ‘invisível’, a partir da ‘liberdade’ que gozamos…
É que
a repressão mais perfeita é aquela que não precisa acontecer…
Pois
é assumida pelo próprio indivíduo em si mesmo...
Diante de tantas condições favoráveis à escravidão...
E dissociadas, portanto, da
liberdade…
Torna-se fácil compreender o porquê da maior parte de nós...
Preferir continuar na caverna…
E tomar
o ilusório como real…
Da
mesma maneira que se compreende o motivo de sermos agentes repressivos…
Contra
os que fogem do sistema, sejam os outros, sejamos nós mesmos…
O
que implica dizer que glorificamos a mentira…
E
tomamos por impostores os que se dedicam à verdade…
Afinal,
como disse Orwell:
«Quanto mais a sociedade se distancia da verdade...
Mais ela odeia aqueles que a revelam»…
Posto
isso, ao aceitarmos o modo como a sociedade se organiza e todos os seus ditames…
Automaticamente
decidimos permanecer na caverna…
E
contribuir para a manutenção de um sistema de organização política e social…
O qual por trás da alegria e satisfação...
Esconde a exploração, a desigualdade e a
ignorância…
Mas,
apesar de não haver condições próprias…
Para
que haja um despertar do indivíduo da sua situação de ignorância…
É
cada vez mais premente que se entenda que o modo hierárquico da sociedade…
Não
se modificará de cima para baixo…
É
antes necessário a cada um de nós, dentro das suas oportunidades…
Tentar
encontrar pontos de luz que nos ajudem a encontrar a saída da ignorância…
E,
por conseguinte, da nossa condição cada vez mais escravizante…
Se o
desconhecido magnetiza pelo medo…
É
apenas o conhecimento e a liberdade que nos permitirão enfrentá-lo…
Sabendo
que todo aquele que desperta…
Sempre
apontará para as correntes daqueles que permanecem presos…
Mas…
Ainda assim, tenhamos também em mente…
Que
muitos, por mais oportunidades que recebam…
Irão
sempre preferir permanecer na sua ignorância, na caverna…
Ou
seja, no oposto da liberdade…
Pois
é sempre mais cómodo assumir o lugar de espetador…
Assim
sendo, levantar do sofá, ser um lutador…
Não
será um ato a observar pelo Homem de hoje…
Pois
como disse Nietzsche:
«Por
vezes as pessoas não querem ouvir a verdade…
Porque
não desejam que as suas ilusões sejam destruídas»…
A
liberdade esfuma-se, pois, a passos largos…
O
medo da verdade parece estar a vencer…
A
ignorância ganha força…
O Homem continua na caverna…”
(Inédito)
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