“Sinto-me
feliz pelo facto da poesia inspirar a minha vida…
Pois,
a poesia é um modo de ler o mundo e escrever nele um outro mundo…
Todos
desejamos viver num mundo melhor…
Um
mundo que tenha tudo de novo e muito pouco de mundo…
A isso
alguns chamam utopia…
A
palavra ‘utopia’ quer dizer o ‘não-lugar’…
Em
contraponto com o lugar concreto que é o nosso mundo real…
Mas,
curiosamente, também isso a poesia inverteu…
O
chamado mundo real é aquele que se apresenta como um verdadeiro não-lugar…
Um
lugar vazio onde cabemos apenas como ilusão virtual…
Não
é o caso das palavras…
As
palavras também nascem, envelhecem e morrem…
E
conhecer a origem e a história das palavras faz-nos mais donos das palavras…
E,
consequentemente, mais donos da nossa existência…
Ora,
o drama é que hoje deixámos de ler a raiz das palavras…
Veja-se
o exemplo da palavra ‘ler’ que vem do latim ‘leger’…
E que quer
dizer ‘escolher’…
Pois,
cada vez mais nós somos os escolhidos…
E deixámos
de ler o mundo…
Falamos
em ler e pensamos apenas nos textos escritos…
O
senso comum diz que lemos apenas palavras…
Mas
a ideia de leitura aplica-se a um vasto universo…
Nós
lemos as emoções nos rostos, lemos o clima nas nuvens, lemos o mundo…
Tudo
pode ser lido…
Depende
apenas da intenção de descoberta do nosso olhar…
Queixamo-nos
de que cada vez se lê menos…
Mas
o deficit de leitura é muito mais geral…
Não
sabemos ler o mundo, nem lemos os outros…
Deste
modo, perdemos algo que que nunca chegaremos a saber…
Por
isso, eu gosto de poesia…
De
através dela desafiar o impossível e dizer o indizível…
Converter
o real em aparência pura…
E,
se possível, ler também as pessoas e o mundo…”
(Inédito)
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