A POESIA... É DO LEITOR...

“O poeta inspira-se… A poesia nasce… O que fica a faltar? Lerem-me, caros leitores! Leiam-me como se eu fosse o vosso último alimento… Leiam-me como se não houvesse amanhã… Leiam-me e extraiam de mim a vossa derradeira inspiração… Leiam-me como se eu fosse o céu que vos sustenta… Ou, simplesmente… Como se eu fosse apenas um outro alguém… Ainda que sendo eu simples poesia... Leiam-me... Para que eu passe a fazer também parte de vós…”

25 agosto 2022

OLHOS VAGABUNDOS...



“Ver é um ato muito complicado…

O que é um pouco estranho…

Pois temos dois olhos…

E são de fácil compreensão científica…

A sua física é idêntica à de uma máquina fotográfica…

 Mas existe algo na visão que não pertence à física…

Como dizia Blake:

«A árvore que o sábio vê não é a mesma árvore que o tolo vê…»

Eu falo por experiência própria…

E por isso, muito do que vejo, vira poesia…

Mas conheço muitos de visão perfeita que nada veem…

O Alberto Caeiro tinha razão:

«Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores…

Não basta abrir a janela para ver os campos e os rios…»

O ato de ver não é, de facto, coisa assim tão natural…

Precisa ser também aprendido…

Mas existe outra condição subtil que faz também toda a diferença:

- O lugar onde os olhos são guardados…

Se os olhos estão na caixa de ferramentas…

Eles são apenas apetrechos que usamos pela sua função prática…

O ver se subordina, neste caso, apenas ao fazer…

Claro, isto é necessário, mas convenhamos que é muito pobre…

Os olhos não gozam…

Ah! Mas quando os olhos estão na caixa dos brinquedos…

Aí eles se transformam em órgãos de prazer…

Brincam com o que veem…

Olham pelo prazer de olhar, querendo fazer amor com o mundo…

A primeira função da educação deveria ser, pois, ensinar a ver…

Em que o professor nada teria a ensinar…

Apenas teria de cuidar para que os olhos dos seus alunos…

Fossem olhos vagabundos…”


(Inédito)

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